O que acontece quando você está inserido em mundo de pessoas poderosas que não ligam para como os mais fracos vão conseguir sobreviver dia após dia? Desde pequeno, eu sei que se eu não lutar por mim, ninguém mais irá fazer. Claro, talvez os meus pais o fizessem em meu lugar, mas agora eles não estão mais aqui. Calma, eu sei que falando desse jeito parece que eles estão mortos, mas não é isso. Nós apenas nos separamos, foi isso. Eu cresci em uma família de artistas de rua e tirávamos nosso sustento do dinheiro (ou esmola, chame como quiser) que as pessoas nos davam em troca. O sonho da mamãe era entrar para um circo itinerante, mas nunca chegamos a nos apresentar para mais que uma dúzia de pessoas que passavam pela rua. Eu queria poder ainda estar com ela e o papai, mas ser uma criança amaldiçoada não me permitia realizar tal desejo. É, eu percebi que o melhor que eu podia fazer para as pessoas ao meu redor era me afastar delas.
Isso não me agradava, mas pensar que eu poderia condená-los a uma morte horrenda, tal qual o meu irmão, somente por estarem perto de mim era ainda pior. Foi por isso que saí de Ilusia Kingdom e, agora, eu estava em Toroa Island. Se quer saber, estar longe do pequeno mundinho em que cresci e tinha me acostumado não era fácil, mas eu nunca fiz o tipo que se deixa abalar. Eu sabia que cedo ou tarde eu poderia voltar para casa e, quando eu o fizesse, eu esperava poder retornar bem-sucedido o suficiente para que meus pais não mais precisassem usar o seu dom para sobreviver; eu queria que eles pudessem fazê-lo apenas por amor e não por necessidade.
Foi pensando em alcançar tal patamar um dia que eu entrei na Marinha. É, eu sei, parece extremamente aleatório falando assim, mas foi a melhor alternativa que eu encontrei de conseguir ser alguém longe da minha terra natal. Pensando bem, acho que no fundo a minha antipatia por piratas também colaborou para tal decisão. Ora, não fosse por eles eu teria conseguido me despedir dos meus pais antes de partir pelo menos, então como eu poderia gostar deles?
Naquele dia, eu tinha ido às ruas cedo pela manhã. Com um baralho de cartas em mãos, eu estava pronto para fazer o mesmo que eu fiz nos últimos anos: ver o futuro de pessoas influenciáveis que eu encontrasse na rua. Aquela não era uma atividade que seria vista com bons olhos por outros marinheiros, isso eu sabia, mas não era ilegal. Eu não estava passando fome, se quer saber, e não precisava de dinheiro. No entanto, eu não queria que minhas habilidades se deteriorassem por falta de prática.
Foi por isso que eu procurei uma rua movimentada e com um pedaço de madeira velha sobre as pernas, eu me sentei em algum ponto minimamente exposto. Com o baralho em mãos, comecei a cortá-lo e embaralhá-lo com uma facilidade que talvez ajudasse a passar alguma credibilidade. Conforme as pessoas passavam, eu as encarei como se fosse pedir algo, mas me mantive em silêncio. Me preparando mentalmente para aquilo, eu respirei fundo antes de anunciar meus serviços.
— Vamos, vamos, veja o seu futuro nas cartas! Será que aquela pessoa também está interessada em você? Seus negócios prosperarão? Tudo isso e muito mais a uma carta de distância. — anunciei elevando a voz como um comerciante que tenta convencer seus clientes a se aproximarem e comprarem algo. Eu não sabia o que me esperava naquele dia, mas eu certamente tinha um bom pressentimento.